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domingo, 5 de agosto de 2012

Colegas e amigos

O Gabriel, meu neto pré-adolescente, reclamou não ter amigos em Vila Velha, alegando que todos eles teriam ficado no Rio de Janeiro onde, antes, a família morava. “Aqui eu não tenho sequer um amigo”, disse à mãe, que respondeu, mencionando alguns de seus coleguinhas, com quem está sempre brincando.

O Gabriel foi preciso e até  filosófico em sua resposta: “Aqui eu tenho colegas, não amigos; meus amigos ficaram no Rio”.

Discerniu bem o Gabriel. Porque amigo é amigo, colega é colega. Colegas são muitos; amigos são poucos. Muito poucos. Colegas vem e vão, conforme as situações, lugares e fases da vida. Colega de colégio, de infância, de escola, de faculdade, de emprego e por ai vai.

Pastores tem o hábito de chamar uns aos outros de colega. “Ei, colega”, dizem. E nisto estão certos, porque, em regra, são apenas  colegas. “Colegas de ministério”. E aqui eu me lasquei. Entendia e pensava pastores como amigos e irmãos, em especial alguns deles, de longa e estreita convivência. Que nada! No máximo amizade circunstancial e utilitarista; no interesse da corporação religiosa. Lidei com centenas deles, pastores, durante anos. No dia da aflição, quando os sinais se tornaram confusos e contraditórios, poucos se revelaram amigos de verdade.

Existem, todavia, amigos, e, mercê de Deus, eu os tenho.  Pastores, até... . Um deles, já velho e com saúde frágil, me liga da Bahia e me proporciona a alegria de longas conversas por telefone; outros, me surpreenderam, visto que nem tão próximos éramos antes.

Citar nomes, não me convém fazê-lo, exceto um, que menciono com emoção e saudades, porque já não mais está entre nós. Refiro-me ao Haroldo Silva. Figura extraordinária! Integridade irrefutável. Santidade na maneira de ser e viver, mas sem afetação, sem cacoetes espirituais.

Português castiço, linguajar escorreito e domínio da língua inglesa, fizeram dele o melhor interprete que conheci, em congressos e palestras por este Brasil afora. Nunca perdeu a simplicidade e pureza de alma. À semelhança da violeta anônima, sua vida, discreta e simples, estava sempre a espalhar o bom perfume de Cristo.

Nem o tempo, nem a distância, nem  circunstâncias  de minha vida pessoal e familiar, nem eventuais diferenças conceituais, se é que existiram, foram suficientes  para provocar afastamentos; muito menos, rupturas.

Vivendo o dia da tormenta, refugiava-me sempre na fazenda de minhas heranças familiares. O Haroldo, transplantado e com saúde frágil, saiu do interior de São Paulo e veio estar  comigo, lá no sertão de minhas origens, onde já estivera, quando ainda adolescentes.

Depois de décadas, lá estávamos de volta. Eu, vivendo o mais complicado período de minha vida e ele, a mesma pessoa, a mesma consideração, o mesmo temor a Deus, a mesma simplicidade, a mesma lealdade.

Diz Provérbios: ”O amigo ama em todo o tempo e na angústia ele se revela um irmão”.
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Em um de nossos últimos encontros, ele e a sua querida  Charllote voltando a residir na América, abriu-me as portas de sua casa: “Daniel, um quarto em minha casa estará sempre disponível a você e a Mardeline(Déia) quando forem aos Estados Unidos”.

Teve morte prematura. Com dificuldade a Charllote conseguiu que falasse comigo ao telefone. Sua voz frágil e rouca indicava que o momento da partida era chegado. O avião já se posicionara para a última grande viagem. “Quero vê-lo pessoalmente. Estou  tentando renovar o meu visto de entrada na América”, disse-lhe. Quase inaudível, me respondeu: “Nos encontraremos na Canaã Celestial”.

No dia seguinte o avião decolou em direção á Pátria Celeste, levando o meu grande amigo e irmão Haroldo Silva, que certamente foi recebido com o bem-vindo celestial:               


"Vinde, benditos de meu pai, possuí por herança o Reino que vos está preparado desde a fundação do mundo"
  
Gosto e estou sempre a repetir uma frase do Ricardo Gondim:

 “Quero acreditar em amizades que não se intimidam com censuras, que não retrocedem diante do perigo e que não abandonam na hora do apedrejamento. Amigos não desertam”.

Ao único Deus!

Dnl

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