Avaliando e reavaliando

Quando esteve conosco pela primeira vez o Carlos Bregantim falou de “encanto, desencanto e reencanto”, aludindo às três etapas de sua caminhada de fé.

Venho do movimento de Renovação Espiritual. Tive o privilégio de participar de momentos históricos do meio batista. A influência do casal Rego Nascimento em minha vida pessoal  e, sobretudo, em meus ideais de fé, perduram, passados já 50 anos. As mensagens poderosas e apaixonadas do Pastor Rego, ouvidas a cada domingo, na Lagoinha da Rua Formiga e, depois, Manoel Macedo,163; as noites de vigílias, na casa do irmão Antônio Lourenço; as tardes de domingo, eu ainda adolescente, percorrendo ruas e bairros, pregando ao ar-livre, ao lado de irmãos queridos da época, quase todos já morando na Casa do Pai. Também neste período romântico, repleto de vida e de paixão por Jesus, as confusões doutrinárias e disputas religiosas não deixaram por menos, com cadeado lacrando salão de cultos e deixando toda uma igreja na rua ou tendo que se reunir em templos emprestados e casas de irmãos solidários. Estava desencadeada a luta entre irmãos batistas.

Hoje me permito uma avaliação crítica das desavenças por causa de Renovação Espiritual. Pesadas discussões e exacerbada paixão denominacional, levaram à separação entre tradicionais e renovados, a nível de Minas e, depois, de Brasil. Chumbo grosso dos dois lados. Batistas tradicionais batendo pesado e batistas renovados reagindo de modo nem sempre piedoso e renovado.

Fundação do STEB, e lá me encontrava, com uma geração de pioneiros e idealistas, apaixonados por Jesus. Liderados por Wilson Regis, grande idealizador do STEB da época, adentramos, nós, alunos fundadores, o auditório da  3ª. Igreja Batista, cantando, emocionados, “nem sempre será pra o lugar que eu quiser que o Mestre me tem de mandar”, para ouvir a aula inaugural, proferida pelo Ministro do STF, Dr. Antônio Martins Vilas Boas. Nem bem terminara o primeiro ano letivo e a “brigaiada” se instalara na liderança, com pastores se desentendendo e se acusando e, nós, alunos ansiosos, no meio daquele tiroteio de ataques, dissensões e mútuas acusações. E éramos renovados!

Vieram a CBN, Cobemge, Compromisso de Açucena, Encontros Missionários, Sebemge, Ordem de Pastores; lá me encontrava, dando, dentro de minhas limitações e circunstâncias pessoais, o melhor de meus sonhos, paixão e ideais e, também, conhecendo os intestinos e vísceras nada cheirosos, da máquina religiosa.

Na década de 70, vi-me em crise existencial, quando tive sérias dúvidas sobre a validade do sistema religioso, no qual nascera e me criara, para, finalmente, racionalizar e concluir que o próprio Deus teria levantado estes mesmos sistemas, Batistas Nacionais em especial, afim de cumprir um determinado papel na historia da fé. Dei por resolvidas as minhas aflições, argumentando comigo mesmo, que Deus é o construtor e condutor da história humana e, também, de suas instituições. A partir desse raciocínio, sincero mas simplista, falei aos pastores da Ormiban, em evento nacional, realizado na  cidade de “Belém de Maria”, interior de Pernambuco, janeiro de 1988. O  tema de minha palavra, “Quem sabe se para um tempo como este chegaste a este reino”, refletia a determinação de crer numa espécie de “destino manifesto” de batistas nacionais e estava coerente com a solução que dera às minhas duvidas existenciais.

Sempre gostei do trabalho geral mas Nova Canaã foi minha grande paixão. Um caso de amor intenso e continuado. Hoje, observando-a á distância, percebo  sinais de retrocesso na direção do conservadorismo e da rigidez conceitual, estuários da intolerância, com risco de negação de sua bela história. Gostaria de estar errado, mas não me surpreenderá a consolidação dessa tendência.  Nesse mundo religioso, nada mais me surpreende. A forma como se deu a saída do pastor Gilson e os fatos pertinentes à mesma, enodoaram, e para sempre, o currículo da amada Igreja Nova Canaã. Racionalizações e justificativas jamais conseguirão exorcizar esse fantasma. Ainda é cedo para se fazer uma avaliação segura mas temo que, de sua identidade histórica, marcada pelo compromisso com o Evangelho(“E”maiúsculo!), pela leveza, ousadia e capacidade de aceitar desafios, permaneçam o nome e o rico patrimônio físico. Desejo sinceramente estar errado em minhas percepções. Digo que é preciso aguardar um pouco mais para, então, se fazer avaliação consistente e definitiva.

À luz do que acabo de dizer, facilmente se perceberá o meu afastamento dos sistemas religiosos. Não me dizem mais nada e nada mais tenho a ver com eles. Do ninho religioso, ficam-me os laços com Nova Canaã, onde sou pastor jubilado, e as gratas recordações de mais de 33 anos de amor e mútua doação.

Ao Único Deus!

Dnl

Em 04/12/2012